TÍTULO: As Mornas LOCAL: Cabo Verde - S. Vicente DATA: 1995 INFIRMANTE: SEXO: M IDADE: 54 anos ESCOLARIDADE: 4 anos PROFISSÃO: Marinheiro - portanto, estava-me a dizer, eh, estávamos a falar sobre a origem da palavra "morna". -> sim. eh, dizem que a palavra "morna" nasceu de, do vocábulo "mourni[...]", "mourning", eh, quer dizer que as pessoas que, que cantavam não cantavam, quer dizer, eh, sabe que às vezes quando no[...], eh, [...], como se diz, na, quando, eh, aconteceu que morreu alguma pessoa - sim -> etc., então o inglês d[...], o inglês diz "they are mourning" - hum, hum. -> estão no sentimento do morto, etc. - hum, hum. -> e então dizem que o senti[...], o senti[...], o sentimento, o canto da morna - hum, hum -> saiu foi destas raízes. - hum, hum. -> eu não sei se é verdade ou se é mentira. mas, eu digo, eu posso reproduzir aquilo que os mais velhos - hum, hum. -> disseram. eu não sei se é verdade. mas, eh, eu acho, eu acho que até certo ponto pode ser isso - hum, hum. -> porque, eu não vejo nenhum, nenhum vocábulo ligado à morna. bom, mas o que eu posso dizer é que a morna é realmente cabo-verdiana - hum, hum. -> que, os mais velhos dizem que a morna nasceu na, na ilha da Boa Vista - hum, hum. -> depois passou para a Ilha Brava e depois São Vicente, porque essas três ilhas têm, têm um contexto muito diferente, eh, no ritmo e na melodia da morna. eh, é natural que, que essa ideia de que esta palavra "morna" tenha vindo - hum, hum. -> a sua origem da, da palavra "mourning" - a mim faz-me sempre uma certa confusão, eu sou dos Açores e nos Açores nós temos uma palavra "mornaça". e mornaça significa estar assim... a, a conversar assi[...], mas assim uma conversa mole, sem fazer nada. e eu -> sim - na minha cabeça f[...], estabeleço sempre uma certa ligação... a morna c[...], assim o ambiente, um ambiente... não é calmo, não sei... -> pode ser, mas, eh, eu não posso, quer dizer, eu não sei dizer directamente, porque, sabe que a nossa história tem muito para contar, não é, - hum, hum. -> nunca, a história nunca foi contada devidamente, porque... claro que não foi escrita muito bem claro e etc. - hum, hum. -> há coisas que ultrapassam. - claro! e qual é o interesse dos jovens actualmente por, por essas r[...], por essas raízes, ao fim e ao cabo? -> eu acho que estamos a regressar às raízes. - hum, hum. -> há algum tempo que eu estou notando se, que... a juventude está-se a interessar - hum, hum. -> pela, pela, pela nossa cultura. eh, havia alguns anos atrás que estavam, estavam, quer dizer, um bocadinho afastados, mas agora estão a regressar, porque, quer dizer, isso é um fenómeno mundial. isto há, isto é mundialmente, agora neste momento, neste preciso momento, quase todas as nações do mundo estão a regressar. pelo que eu tenho visto é assim. através de rádios e gravações que eu tenho, que eu tenho acompanhado, estou a ver que quase todas as nações do mundo estão a regressar às raízes. e Cabo Verde também está a regressar, muito embora que há uma certa margem de juventude que acho, eh, querem estar ligados a, a coisas modernas, que não nos pertence. pertence a ou[...], a outros povos, a outras, a outras nações, etc., mas felizmente que o que estou a ver que há, há pessoas aqui na juventude que estão interessados mesmo pela raiz da cultura cabo-verdiana. - hum, hum. e, e há, há, há estruturas para corresponderem a esse interesse dos jovens pelas raízes? -> essas estruturas estão um bocadinho fracas. - hum, hum. -> estão um bocadinho fracas. eu não sei se é por falta de finanças ou é, ou é, se é por falta de... cultura no seu eu ou se é, ou não sei p[...], o que é que é esse fenómeno. - hum, hum. -> mas, eh, temos muito que andar para chegar, para chegar até lá. porque... a nossa cultura aqui está um bocadinho enfraquecida mas, eu digo t[...], talvez por desinteresse ou talvez por falta de dinheiros. - hum, hum. -> eu continuo fazendo a minha parte - hum, hum. -> agora o resto eu não sei. - bom, cada um que faça a sua, não é, -> sim. - diga-me uma coisa: mas, por exemplo, no que toca às mornas, eh, isso exige uma aprendizagem, não é, não é de um dia para o outro que a pessoa diz "vou escrever uma morna" não há assim rapa[...], jovens à sua volta que tentem captar o espírito? - tem regras, não é, - tem as suas regras? -> sim, mas, eh, nem, nem, nem, eh, isto é, isto é mais, quer dizer, como posso dizer? eh, eh, eh, isto é mais autodidáctico. - hum, hum. -> eh, é u[...], é uma experiência autodidáctica, aqui - hum, hum. -> em Cabo Verde. alguns às vezes chegam, vão perguntar-me como é, como é que eu comecei a fazer mornas, como é... o meu interesse, etc. - hum, hum. -> eh, alguns têm interesse a aprender e outros não. mas, isso é, a maioria, a maioria aprende a fazer um mi menor ou um ré menor no violão, pronto, já sabe muito, e vai fazer, vai, vai compor e às vezes, vai escrever uma coisa que não está dentro de, da nossa tradição. por não ter aprendido, sabe, - hum, hum. -> quem não, não estudou não aprendeu. eh, eles têm boa vontade. - hum, hum. -> eles têm boa vontade. mas é que esta boa vontade não está bem dirigida. eu espero que no futuro as coisas tornam de uma maneira diferente para que eles cheguem onde querem.